The New York Times
"Muito bem, já chega", ele disse aos médicos depois de uma hora. "Esses testes de memória são exaustivos".
O homem, Ralph, saudável profissional da saúde que pediu a omissão do sobrenome por questões de privacidade, tem epilepsia severa. A operação para encontrar a fonte dos ataques deu aos pesquisadores uma oportunidade excelente para estudar a biologia da memória.
O Departamento de Defesa dos Estados Unidos anunciou um investimento de US$ 40 milhões naquele que se tornou o ramo mais veloz da neurociência: gravação cerebral direta. Dois centros, um na Universidade da Pensilvânia e o outro na Universidade da Califórnia, campus de Los Angeles, venceram contratos para desenvolver implantes cerebrais para déficits de memória.
A intenção é criar novos tratamentos para lesões cerebrais traumáticas, ferimento típico das guerras no Iraque e no Afeganistão. O sintoma mais devastador é o enfraquecimento da memória e do raciocínio. Cientistas descobriram em estudos preliminares que podem aguçar alguns tipos de memória pela gravação direta e estimulando circuitos profundos no cérebro.
Ao contrário de imagens do cérebro, a gravação direta cerebral permite aos cientistas conduzir experimentos enquanto escutam o diálogo interno do cérebro em tempo real, usando epiléticos como Ralph ou pessoas com mal de Parkinson como colaboradores ativos.
A técnica produziu o retrato mais claro até agora de como os circuitos neurais funcionam, levantando esperanças de novas terapias para depressão e ansiedade, bem como problemas cognitivos. Porém, especialistas também temem possíveis efeitos colaterais quando mexem diretamente com a memória.
'Uma década atrás, somente alguns centros tinham o conhecimento para realizar esse tipo de experimento em tempo real no contexto de cirurgia de primeira linha', disse Michael Kahana, neurocientista da Universidade da Pensilvânia e vencedor de um dos novos contratos concedidos pela Agência de Projetos de Pesquisa Avançada da Defesa (Darpa, na sigla em inglês). 'Hoje, existem dezenas delas, com mais a caminho; de repente, é uma área em alta'.
Ralph estava nervoso a caminho do hospital. Ele sabia que a 'avaliação diagnóstica' que o médico aqui da Universidade Thomas Jefferson havia recomendado não era um procedimento rápido de consultório. Era quase uma expedição de pesca – nas profundezas de seu cérebro.
A epilepsia é um dos grandes mistérios da medicina. Os ataques que caracterizam o distúrbio são causados por tempestades elétricas no cérebro tão difíceis de prever quanto borrascas em mar aberto. Elas podem surgir cedo na vida, por motivos que podem ser parcialmente genéticos, e são comuns após lesões na cabeça, mas os cientistas não sabem identificar uma causa exata.
O que eles sabem é que o cérebro de muitos pacientes tem uma zona de alta atividade de onde os ataques se originam – e que remover aquele pedaço de tecido pode reduzir os sintomas, por vezes drasticamente. O desafio é encontrar essa região em cada pessoa.
Desde a década de 1950, os cirurgiões trabalharam por instinto e experiência, estimulando pontos na superfície do cérebro, guiados pelo paciente. Já em pessoas como Ralph, eles precisam mapear a superfície cerebral e sondar suas profundezas. Eles abriram buracos no topo do crânio e prenderam 11 sondas profundas nos lobos temporais mediais, próximo de uma área chamada hipocampo, mais ou menos na altura do ouvido.
Clique e leia a narração da experiência cerebral realizada pelos americanos.